«Não consigo abrir um livro sem terror: acredito que a literatura mata.

Mata como um veneno no sangue. Ninguém se apercebe a tempo de procurar o antídoto. Que, aliás, não existe. Mesmo parar de ler não resolve nada. Infiltrado, o veneno literário torna-se carne da própria carne, a ponto de já ninguém saber quem pensa dentro de si: a ilusão de uma voz original, ou a das personagens que entraram sem pedir licença.

Tudo convida a não acreditarmos nesse poder mortífero. As montras entulham-se de papel impresso com tinta, como escreve algures Pessoa, a fingir que não tem nada a ver com o assunto (reconhecemos esse tom displicente; é, regra geral, o do assassino). Tempos pós-modernos, diz-se, estes em que se lê em segurança. Já ninguém pede ao livro que mate (ou suicide). A literatura torna-se entretenimento. Requiescat in pace?

Mas também do diabo se sabe, Baudelaire avisou, que o seu último truque, o mais traiçoeiro, consiste em fazer-nos crer que não existe. Talvez a literatura se esconda, tímida, sob uma aparência inocente. Talvez assim nos apanhe desprevenidos, portanto vulneráveis. Presas fáceis.

Daí o meu terror.

Nenhum leitor sabe se chegará ao fim de um livro: talvez o veneno o precipite pelo caminho. Observo as estantes de esguelha, como a criança receia o monstro no canto mais escuro do quarto. Penso: todos estes livros entram em mim com desplante. Schopenhauer dizia que, ao lermos um livro, é o livro que pensa por nós. Seja como for, on me pense, acrescenta Rimbaud, com ou sem literatura. E se quem-pensa-em-mim descobrir a morte? Isto não nos deveria fazer perder o sono?

Alguns livros convidam a matar. Outros, ao suicídio. Outros ainda, mais subtis, limitam-se a relativizar a morte – meio caminho para morrer. Todos são substâncias perigosas, como os medicamentos. Só deveriam poder ser comprados com receita médica ou atestado de robustez intelectual. Alguns autores, aqui e ali, indicam nas primeiras páginas a posologia: este livro só serve para homens que querem ultrapassar a humanidade, exige Nietzsche, no seu Zaratustra. Os restantes – que entrem por sua conta e risco.»

[in Substâncias Perigosas – Cem breves lições em que se explica por que meios os livros matam os seus leitores, de Pedro Eiras, Livrododia, 2010]

Daqui, onde tem um sem fim de outros excertos e posts interessantes.

E, aproveitando, uma ótima Páscoa pra todo o mundo!

https://www.terapiadapalavra.com.br/entrevista-affonso-romano-literatura-escrita-transformacao/
Correio Desaparecido do Japão: Cartas para os que partiram

Correio Desaparecido do Japão: Cartas para os que partiram

Na ilha de Awashima, no Japão, um antigo prédio dos correios se tornou um santuário de memórias. Conhecido como “Correio Desaparecido”, ele abriga mais de 60 mil cartas destinadas a quem já não pode respondê-las — entes queridos falecidos, versões passadas e futuras de quem escreve, até mesmo animais de estimação. O espaço é mantido por Katsuhisa Nakata, um ex-carteiro de 90 anos que acolhe essas mensagens como correspondência oficial.

A prática de escrever cartas não enviadas vai além do simbolismo e tem respaldo científico como ferramenta terapêutica. Estudos mostram que essa forma de escrita ajuda a processar emoções, aliviar a ansiedade e promover o autoconhecimento. Seja para despedidas, pedidos de perdão ou diálogos internos, escrever sem a expectativa de resposta pode ser um poderoso exercício de cura emocional.

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